Para aqueles que decidiram trilhar o caminho de pedras e flores.

trilogia-as-filhas-de-dana-01

Há um pequeno porém do porque esta resenha ser tão diferente das outras e do porque resolvi que esta deveria ser diferente das outras (rsrsrs). Por se tratar de uma trilogia, eu decidi que faria uma visão geral da trilogia sem spoilers. E, primeiramente, esse foi o livro mais real de bruxas pagãs que eu já li. E não digo que foi real pela época, contexto, as imagens femininas fortes e independentes, mas por sentir na pele delas, enquanto lia cada parágrafo seus desafios diários.

A trilogia da autora brasileira Simone O. Marques, nos traz uma realidade de um dos piores momentos que a humanidade mostrou-se intolerante e ignorante: a inquisição. Mulheres que nem sabiam o que significava o termo bruxa eram condenadas por serem autônomas, por serem bonitas, férteis, conhecerem a natureza e saberem como utilizá-la a seu favor. E nesta trilogia, vemos cada vez mais o crescimento destas mulheres, que se tornavam fortes e capazes de lutarem por suas próprias crenças, embora vivessem mascaradas para que não fossem descobertas pelos olhos da igreja que as condenavam.
O que estou dizendo é que, embora as protagonistas dessa história fossem realmente pagãs, que mal fazem essas mulheres? O pior de tudo: ainda vivemos nesse mesmo mundo? Afinal, parece tão distante, mas o olhar do julgamento, da intolerância, da ignorância, ainda é uma coisa que anda colada com os tempos em que vivemos, e vem se despertando cada vez mais para que nunca caia no esquecimento e que lembre: estamos de olho em você!

Enfim, falando um pouco do que achei: eu simplesmente amei toda a trilogia. É um romance de época misturando um pouco de ficção, embora no final, a autora afirme que tem toda uma pesquisa acerca dos livros e que se trata de uma linhagem de mulheres reais atuantes em suas épocas, isso é o mais surpreendente de tudo. Sempre que me deparo com algum livro que fala no final que é baseado em algum fato, embora a história não seja de todo factual, um arrepio percorre todo meu corpo e me dá uma sensação boa e de realidade. Eu fico imaginando o que essas mulheres passaram para que sua linhagem chegasse tão a frente e o que cativa são os personagens masculinos que deram apoio a estas mulheres, que realmente enxergavam a frente de seu tempo e que ainda precisamos de imagens fortes como estas que enxerguem a frente de seu tempo. Então, amei toda a trilogia, ela tem um vocabulário coloquial que se adapta geograficamente entre Portugal e Brasil, além de se adaptar às épocas em que se passa a história. Os três livros: Paganus, Samhain e Beltane tem capas maravilhosas e as páginas são todas decoradas, amareladas do jeito que eu gosto e me deixou viciada. Consegui perder várias vezes a noção do tempo e li cada um em três dias. É uma leitura super rápida, não são livros de páginas numerosas, mas isso não é um ponto negativo. Só que no final você espera por uma continuação.

AVISO IMPORTANTE: AS TRÊS RESENHAS A SEGUIR PODEM CONTER SPOILER

paganus

Paganus é o primeiro volume da Saga As Filhas de Dana. Vou dizer que logo os primeiros capítulos eu achei um pouco tedioso, embora soubesse que esses primeiros seriam a chave para a história dos capítulos seguintes. Conhecemos os gêmeos Diogo e Douglas que, desde pequenos, competem um com o outro na busca de serem um melhor que o outro. Não é preciso ser exímio pra saber que Diogo é o gêmeo do bem e Douglas o gêmeo do mal, tanto que o pai de ambos tenta corrigir Diogo durante a infância até a época adulta sem muitos resultados, e eles são os principais a dar inicio à trama de perseguição às bruxas, embora Diogo não seja a favor, ele é forçado pelo pai a caminhar para este caminho.
O engraçado é que, realmente, em vilas e vilarejos em Portugal, existiam tribos pagãs que foram perseguidas e convertidas, e são essas vilãs e vilarejos que em Paganus são queimadas com mulheres, homens, crianças e idosos. E em meio a essa perseguição, Diogo conhece Gleide, a personagem mais forte de toda a trama. Você chega a ter ódio dela, mas ela é de um espírito forte e totalmente indomável, espiritualista, livre e até mesmo geniosa. Ele se encanta pela filha de Gleide, Adele, que carrega um bebê na noite em que o pai dele segue até a vila para converter os pagãos ou os levarem para a inquisição.
Eu, sinceramente, acho esse o ponto mais forte de toda a história, pois Diogo se tranca dentro de uma casa com Adele que está tendo seu bebê e Gleide que tenta ajudar ela a prosseguir. Tudo está queimando porque Douglas ameaçou colocar fogo na casa se Diogo não saísse e, se existe prova de que Diogo é um homem diferente, então aí está: ele salva Adele e Gleide de morrerem queimadas, ignora completamente o irmão que tentara matá-lo e as leva para um lugar seguro onde Adele tem sua criança em paz. Os dois jovens se apaixonam intensamente e Diogo as ajudam a mascarar suas crenças perante à igreja numa tentativa de proteção. Ele assume a criança de Adele, pois o pai morreu pelas mãos de Douglas. Se eu pudesse dizer, com certeza, quais personagens mais gostei, sem dúvidas seriam Adele e Diogo, porque eles construíram um amor tão grande que nem Gleide foi capaz de se colocar entre eles como barreira, já que esta personagem parece emitir um desagrado enorme pelos homens.
Então eu simplesmente amo esse casal, acho eles o mais forte de todos os casais durante a trilogia, eles fazem de tudo um pelo outro, o que leva Diogo a abandonar seu status, abandonar suas crenças pelo amor de Adele e protegê-la com esse amor como se não houvesse amanhã, como se ela fosse sua vida toda em suas mãos. E há sentimento mais doce que esse?

Os pontos negativos de Paganus foi Gleide, por que realmente gostava dela no início, mas a personalidade forte demais dela e a descrença no amor e nos homens foi uma coisa que foi ficando chata, por que atiçava Diogo de uma forma que constrangia ele e magoava Adele, embora não fique muito evidente a mágoa de Adele. E Douglas, ele foi o maior dos pontos negativos, tão igual a Diogo e tão diferente ao mesmo tempo. Durante toda a trama ele tentava ser algo para agradar o pai e ser o filho perfeito. E você, meu leitor, já deve imaginar o resto se tratando de um personagem tão negro.

Na segunda parte do livro, temos Daniele. Ou seja, Adele e Diogo, eram só um empurrãozinho para o que acontece no restante da trama. E desde o início, Gleide diz que a criança de Adele terá uma missão especial preparada pela Deusa Dana, a qual eles tem toda sua fé. E a menina é preparada por toda a vida pra isso. Daniele é praticamente uma criança quando descobre que o seu propósito se aproxima e ela conhece Guilherme, que deverá ajudá-la a encarar todas as suas escolhas. Mas até mesmo Daniele terá provações e caminhos tortos, tais quais os de sua mãe. Ela sabe que sua missão se encontra do outro lado do oceano, numa terra chamada Brasil e que tomar essa decisão pode custar deixar tudo o que ela ama para trás.
Galere, no começo, Daniele é muito menina ainda, embora esteja na transição de se tornar mulher. E um homem da corte (Dom Francisco), de posses, deseja tomá-la. E conhecendo Diogo, sabemos que ele faria de tudo para proteger sua família. Ela é uma menina muito forte que é levada por Guilherme, junto de seu irmão mais novo Mateus (Angus) para o porto, no intuito de mantê-los seguros ali, longe das garras de Dom Francisco. E quando chegam lá, Guilherme tem a promessa que fizera ao pai de Daniele que a faria feliz e a levaria até o porto para que partisse para o Brasil. Então ela conhece Antônio, o irmão mais velho de Guilherme que logo se encanta pela jovem, e eles ficam todos alojados no pequeno apartamento de Antônio, que ajuda com os papeis do embarque. Nesse meio tempo, Daniele irá percorrer um caminho de pedras e flores, que a levará para a perseguição, a descoberta do seu real amor e a fuga para o Brasil, que é também desencadeada pela descoberta de sua gravidez.

samhain

Em Samhain, Daniele chegou ao Brasil e, sinceramente, esta é a parte que eu mais gosto de toda a história, pois adiante eu começo a pensar em como Daniele é fraca, mas que na verdade não é. Ela compreende que as coisas seguem seu devido caminho, querendo ela ou não, e isso a faz uma personagem realmente forte, e a mais forte, porque ela é a personagem que se lança nos desafios sem pensar duas vezes, a fé dessa mulher é inabalável e ela não é mais uma menina que sofre por ter deixado a família para trás, ela é uma mulher que agora tem filhos, marido e precisa lidar com as dificuldades de ser pagã. Por que, embora a inquisição não tenha vindo ao Brasil, a perseguição se fazia presente e os padres que perseguiam, ou matavam, ou levavam de volta para Portugal para enfrentar a inquisição. E por que este é meu cenário favorito? Por que eu simplesmente me impressionei com a chegada ao Brasil, por que os índios também tinham sua cultura pagã, e não apenas os índios, mas também os negros que vieram como escravos.
Eu falo do crescimento de Daniele, mas vale ressaltar o crescimento dos homens também, pois Antônio, que já tinha a imagem de homem turrão, trabalhador e destemido, passa a ser uma imagem forte dentro de todo o contexto. Ele é um grande companheiro à Daniele, um pai surreal para seus filhos e o homem mais respeitado na fazenda que os acolheu na chegada ao Brasil. Os patrões tinham um enorme carinho pelo casal e seus filhos.
Ouso falar até mesmo de Mateus, que se tornou um guerreiro protetor da família de Antônio, e cada vez mais crescido e esperto. Por que quando eles partem de Portugal, Mateus ainda era uma criança, que chorava pelos pais, sentia falta e tinha a companhia de seus brinquedos e mimos e, quando ele chega ao Brasil, embora ainda seja um menino, começamos a acompanhar o crescimento ao decorrer dos anos de todos estes personagens, inclusive Mateus. Esse é um ponto excelente, não apenas em Samhain, mas em todos os outros livros. Simone sabe exatamente como construir e evoluir um personagem junto da história e por isso me perdi tanto entre as linhas e devorei rapidamente os três livros.
Mas, a partir de determinado ponto da história, passamos a compreender a verdadeira missão que levou Daniele ao Brasil, que ela mesma não compreendia e sabia que não estava no fim; contamos novamente com a presença de Guilherme que voltara na esperança de ter Daniele de volta e uma encruzilhada separa mãe e filha mais uma vez por uma tragédia que ao mesmo tempo se torna uma bênção no final, e a história passa a ser contada, agora, por Tereza, filha de Daniele.
Mas, por que tragédia e ao mesmo tempo uma bênção? Bem, vamos dizer que aprontam para Daniele, o que a separa de sua família. Os índios a levam para a mata onde podem cuidar dela, levando Mateus consigo, que depois volta para levar Antônio que lamentava a morte do bebê Antoninho. Então, um explorador misterioso, de cabelos ruivos, aparece e se identifica com Mateus. Ele começa a contar sua história ao menino de quatorze anos, que por seus recentes atos de manter sua família segura, o fez um homem. O explorador revela que foi apaixonado por Gleide e que tinha uma filha chamada Adele, mas que fora expulso da vida de Gleide por ser apaixonado por ela e, como conhecemos Gleide bem, já sabemos o que isso pode ser para ela. Gente, eu chorei horrores nessa parte, porque é a parte mais emocionante de Samhain. Ele parte com a família de Antônio para suas terras, onde eles podem desfrutar da vida em segurança, deixando, assim, Tereza e o tio Guilherme para trás com uma nova promessa: manter Tereza em segurança, e dessa vez ele não iria falhar.

beltane

Em Beltane, Tereza já está crescida, entrando na fase adolescente onde se torna mulher e a mulher que cuidou dela durante anos está adoentada.
Daniele vive com Antônio em terras afastadas de seu avô cultivando a prosperidade com mais duas filhas que tivera e Antônio aparece para fazer uma visita à Tereza na fazenda. No dia da visita, ela se dá com Miguel Seixas, o sobrinho da mulher que ferrou com Daniele em Samhain (ou que pelo menos ajudou a ferrar). Miguel está tentando, junto de seus escravos, a domar um bezerro que escapou de sua fazenda. Tereza torcia pela bezerra enquanto assistia, embora censurada pela Ama. Ele conseguiu capturar a Bezerra e foi convidado a entrar na casa. Miguel cumprimentou a “avó” de Tereza e foi convidado a retornar com as irmãs quando quisesse. Ele pediu permissão para que levasse Tereza para ver a Bezerra já que notara o quanto ela torcia pelo animal e, assim que se aproximaram e ela passou a mão na bezerra, perguntou se ela teria um nome. Miguel sugeriu que ela lhe desse um nome e a bezerra foi batizada de Finola. E, embora Tereza ainda fosse uma criança em transição, eles se apaixonaram naquele momento.
Mais tarde, o pai de Tereza chegou com o “avô” dela e mais um índio. Ela o reconheceu, apesar dos anos, e não se desgrudou de Antônio que sentia-se nostálgico de estar lá, onde o pequeno filho foi morto e sua filha havia permanecido. Ele tinha intenções de levar Tereza embora, que não sabia que a mãe estava viva.
Guilherme também veio recebê-los e teve sua presença notada pela irmã mais velha de Miguel, Catarina, que desde sempre foi apaixonada por ele e queria ter um pouco do brilho de Daniele. Ela se sentia culpada pela “morte” de Daniele e sua irmã Lara, que também sofria nas mãos da tia, também queria se ver livre da censura. Catarina e Guilherme tiveram uma noite de amor num casebre que o pai da moça havia construído para ficar longe da madrasta e tia dos filhos. Essa noite de amor ficou pregada na mente de ambos por muito tempo depois do ocorrido.
Mais tarde, Antônio disse que Tereza deveria escolher partir ou ficar e que, embora ele quisesse que ela fosse com ele, ela deveria escolher. A menina havia escolhido ficar ao lado dos avós que tanto amava, por que no fundo ela sabia: seu caminho estava ali, a missão que deveria realizar estava bem ali. E na partida de Antônio, algo inusitado aconteceu: a irmã de Miguel, Lara, havia fugido de casa para ir junto deles, e o índio, junto da moça, o convenceu a levá-la junto.
E os anos se passaram, Tereza se tornou uma mulher e o filho do casal que cuidara dela, Henrique havia retornado. Eles eram prometidos em noivado assim que atingissem a idade adulta, o que foi revogado quando Antônio partiu. Henrique não sabia e olhava Tereza com desejo assim que a viu. O mau humor dele afetou toda a casa quando soube que não se casaria com Tereza e não tinha a permissão do pai de ser um pretendente. Miguel novamente reapareceu, num momento que Tereza se viu triste por ter ouvido tantas coisas cruéis sobre sua mãe, ela era acompanhada de uma escrava Iáiá que chamou Miguel quando o viu do outro lado da cerca e ele trouxe felicidade de volta ao rosto de Tereza. Naquela noite, ele foi convidado com a irmã Catarina para jantarem ali e ele havia pedido permissão para namorar Tereza, o que foi consentida por Guilherme e o avô da garota, provocando a ira de Henrique e jogando a verdade na cara de todos: foi a madrasta de Miguel que entregou Daniele à igreja, provocando sua morte e a morte do irmãozinho de Tereza. Além disso, na mesma hora, a morte da avó veio como um tapa na cara que deixou Tereza baqueada.
Ok que, mais pra frente, tudo se resolve por meio de Guilherme, que conta a verdade para Tereza, revelando também que sua mãe continuava viva, mas que era um segredo para mantê-la segura e assegurando que Miguel e suas irmãs nada tiveram em participação do ocorrido, deixando apenas a madrasta e tia deles com todo o crédito.
Um casamento foi marcado, não antes de Henrique tentar abusar de Tereza que estava sob uso de Láudano, uma droga usada como entorpecente para domar meninas que a Ama estava usando nela. Iáiá foi quem percebeu o que estava acontecendo e mandou chamar o tio de Tereza, dando uma pancada na cabeça de Henrique que havia rasgado o vestido de Tereza, que não conseguia se defender e chorava com medo.
Não é preciso ser adivinho para saber que Henrique foi espancado por Guilherme e pelo pai que tomou a decisão de casar Tereza com Miguel e partir à Portugal em seguida para manter Henrique o mais longe possível daquela nova família que se formava. E, também, depois de tanto tempo, Guilherme também se casa com Catarina, descobrindo nela o verdadeiro amor que ele buscava quando veio ao Brasil.
O tempo passa novamente e desta vez ele traz Mateus, irreconhecível, um homem feito e tendo Lara como sua companheira. Eles vieram à nova casa de Tereza, para uma visita, carregando uma criança e a notícia dos pais de Tereza, e um novo ciclo começa. Esse novo ciclo nos leva para 1918, onde conhecemos Adelaide, trancafiada num convento que se apaixona por um jovem padre que é enviado ao convento pelo bispo. A história de Adelaide é bem curtinha, mas as freiras do convento a drogam com Láudano e logo vemos uma jovem incapaz, que é chamada de bruxa e renegada pelo pai por uma briga entre irmãos em que um acabou morrendo e o outro acusou Adelaide de tê-los enfeitiçado um contra o outro por ser tão bela. E ali estava ela, dando continuação a linhagem de Gleide, onde tantas como ela lutaram por suas vidas contra a perseguição. Mas o que esperar de Adelaide? Ela é quem dá as cartas finais de Beltane.

♠ ♠ ♠

De todo meu coração espero que você, meu leitor, leia essa trilogia. A Simone é fantástica, uma escritora brasileira excelente, e eu com certeza quero ler seus outros inúmeros livros. Peço desculpas se eu dei muitos spoilers (rsrsrsrs), mas ainda assim, espero que tenha chegado até aqui e com curiosidade o suficiente para comprar a Saga As Filhas de Dana. Livros que leria novamente com certeza e recomendo. 5 estrelas com toda certeza!!
Um enorme beijo no coração.

Por ninichristie

Escritora e amante de fotografia, 24 anos, formada em Publicidade e Propaganda. Além de ser a louca por livros e ser fã compulsiva da série A Desconstrução de Mara Dyer e a trilogia Jogos Vorazes, também ama de paixão ser fotógrafa.

Deixe uma resposta