Olá, tudo bem? Hoje trago para vocês a resenha de “Em águas profundas”, de Patricia Highsmith – lançado originalmente em 1957. Se você era assinante do Intrínsecos em dezembro de 2020, deve ter recebido esse livro de brinde, como eu. Enfim, a editora estava relançando a obra de Patricia em um novo design, com capa dura etc. (muito lindo, por sinal). Eu deixei para ler ele um pouco depois, e admito que foi uma ótima leitura. Então, confiram a resenha e aproveitem a leitura:
A HISTÓRIA DE “EM ÁGUAS PROFUNDAS”, DE PATRICIA HIGHSMITH
Se dissessem para você que certo casal é realizado e feliz, provavelmente Vic e Melinda discordariam veementemente. Afinal, eles sabem que isso é mais uma fantasia do que uma realidade. Mas tudo bem, eles conseguem se organizar com um acordo um tanto quanto inusitado. Isso porque Melinda pode ter seus casos extraconjugais, desde que não cause um escândalo ou um divórcio caótico, que só trariam problemas para eles e a filha do casal.
Contudo, o que parecia ser o acordo perfeito, logo começa a incomodar Vic. Não pelo acordo em si, mas pelos parceiros que Melinda tem escolhido. Então, surge uma ideia quando um dos “ex” da esposa aparece morto. Vic decide assumir a autoria do crime, só para tentar afugentar os próximos candidatos. A notícia logo se espalha, até que a verdade sobre a morte do cara é revelada. No entanto, o estrago já estava feito e logo as convicções de Vic mudam e causam uma reviravolta na relação, recheada de segredos, manipulação psicológica e sangue.
UMA NARRATIVA DIFERENTE E UMA LEITURA ARRASTADA
Bom, depois dessa sinopse, a história parece intrigante, certo? E, no fim, essa é minha avaliação. Mas de início, devo confessar que a narrativa é um tanto arrastada. Comigo, a leitura não avançou no mesmo ritmo que um thriller como esse poderia avançar. Apesar disso, eu acho que combina com toda a trama psicológica e a história em si – além do fato de ter sido escrita há tantos anos. Ainda assim, não deixei de ficar um pouco decepcionado, pois a promessa parceria de uma história eletrizante e a entrega não é toda assim, só mais para o fim.
Ainda assim, mesmo com essa dificuldade na leitura, inicialmente, a escrita de Patricia é inteligente e muito interessante. Sem dúvida, ela consegue descrever muito bem as relações humanas, principalmente dentro de um casamento com um acordo nada convencional como esse. Mas também consegue narrar como isso impacta também na vizinhança, no relacionamento com os amigos do casal, dentro de uma pequena cidade do interior dos Estados Unidos.
O livro é narrado em terceira pessoa, mas a autora se concentra mais da perspectiva de Vic. Pela narrativa de Patricia, Vic parece até um psicopata. Pelo menos é a impressão que ela passa ao descrever suas atitudes. Mas a verdade é que ele parece ser muito frouxo e submisso em relação a Melinda. Que, por sinal, eu gostaria de falar várias injúrias para descrever ela. Que mulher chata – o que me levará a outro sentimento que tive durante essa leitura, mas chegaremos lá.
O MOTE DE “EM ÁGUAS SOMBRIAS”, DE PATRICIA HIGHSMITH E AS REVIRAVOLTAS
Nas primeiras páginas, o livro pode dar a entender que é uma narrativa sobre casamentos, sobre suas dificuldades etc. Mas, então, acontece uma reviravolta que deixa a história mais interessante e a leitura mais instigante. É meio dúbio, eu sei, mas é verdade. Pois quando você começa a ler, parece dar a impressão que a autora quer dar mais uma aula de como lidar nesse tipo de relação. Mas, não, ela aos poucos vai revelando o que exatamente quer mostrar ao leitor, ou melhor, como entretê-lo.
Depois, acontece outra reviravolta, ainda mais interessante. Então, a narrativa ganha um ritmo muito mais intenso, instigante de ler. É como uma fuga da história mais “pedante” do início. O fato é que a autora só preparava o terreno para o que estava por vir. Contudo, devo dizer que chega a ser um pouco irônico como as coisas evoluem a partir desse momento – e me contem se vocês concordam, pois não posso dar spoilers (rs).
Mas essa segunda parte traz uma mudança significativa nos personagens também. Não posso falar muito para, novamente, não dar spoilers. No entanto, eu entendo como uma inversão de papéis de alguns personagens. É surpreendente de fato. Eu sei que é meio vago, mas se você já leu, ou vai ler, acredito que entenderá o que quero dizer. Mas é uma nítida mudança. O que nos deixa muito pensativos pela natureza humana.
E AÍ VEM O SENTIMENTO CONFLITANTE
A autora constrói sua história de uma forma como não quer nada. Mas, aos poucos, ela vai nos colocando dentro de uma trama de manipulação psicológica de tirar o fôlego. E, para mim, como leitor, é um sentimento dúbio e quase perturbador, conflitante e confuso. A autora mexe muito com nosso psicológico também. Você quase torce para quem é o vilão ou vilã da história. E isso nos diz muito sobre nós mesmos, mas também sobre as pessoas ao nosso redor, que podem refletir os personagens tão bem.
É aquela história de você não saber, exatamente, quem é o mocinho e quem é o vilão da história. Ou melhor, você leitor sabe, mas os personagens não sabem – a não ser o vilão e o mocinho, e a autora, que brinca com você e os personagens de início ao fim. E é interessante acompanhar como o ser humano vai se revelando ao longo da narrativa, como sua verdadeira natureza surge. E como conhecemos pouco de nós mesmos e do que somos capazes de fazer.
“EM ÁGUAS PROFUNDAS”, DE PATRICIA HIGHSMITH, É SENSACIONAL
Sem dúvida, esse é um dos livros mais interessantes que li, escrito de uma forma muito inteligente e sem pontas soltas. Um verdadeiro mergulho nas águas profundas da psique humana – sem querer ser poético (haha), isso se eu estiver usando certo o termo, enfim. Uma coisa curiosa é que só pela metade é que me lembrei que esse é um livro escrito no século 20. Mas não parece, tirando o fato de ser uma narrativa mais desafiadora. Apesar da falta de elementos do nosso dia a dia, a história poderia muito se passar em nosso tempo, sem dificuldades.
Enfim, não há muito mais que eu possa falar sobre esse livro. Com certeza, ele me surpreendeu ao sair de uma história “pedante”, para algo realmente envolvente e instigante, com um final eletrizante. E eu indico muito a leitura, tá bom? Enfim, espero que tenham gostado da dica de hoje e nos vemos na próxima!
Ficha técnica
Em águas profundas
Autora: Patricia Highsmith
Páginas: 304
Editora: Intrínseca
Ano: 2020
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