Livro Na corda bamba - Kiley Reid

Olá, leitores. Tudo bem? Hoje vou falar de um livro muito importante e necessário, principalmente neste momento: “Na corda bamba”, de Kiley Reid. Falo em “necessário” por sua temática envolver um assunto que, ainda hoje, pode ser considerado tabu: o racismo. A obra, lançada pela Editora Arqueiro em 2020, traz uma importante discussão sobre o assunto. Enfim, hoje resolvi trazer a resenha dele pra vocês. Aproveitem a leitura!

A SINOPSE DE “NA CORDA BAMBA”, DE KILEY REID

Emira Tucker é uma jovem negra que trabalha como babá. Certa noite, quando leva a menina branca que ela cuida ao supermercado de um bairro rico, Emira é abordada por um segurança. Ele a acusa de sequestrar Briar. Logo, outras pessoas se aproximam “curiosas” pelo que está acontecendo, e uma pessoa grava toda a situação. Tudo só termina quando Emira liga para o pai de Briar e ele chega ao mercado.

Tão logo soube do incidente, Alix, a mãe de Briar, fica chocada. A empresária, que tem uma marca sobre empoderamento feminino, decide que precisa ajudar Emira e ter a justiça que ela acha que a jovem merece. Mas a própria Emira só quer esquecer o que acontecer. Próxima de perder o seguro-saúde, e sem registro empregatício, ela não precisa dessa exposição. Então, o passado de Alix ressurge e muda tudo na relação das duas.

A NARRATIVA

Bom, esse é um resumo “simples” para tudo o que essa obra representa, de fato. A premissa foi a primeira coisa me conquistou: uma babá negra, cuidando de uma criança branca, acusada de sequestro. Isso por si só já escancara uma realidade muito comum, não apenas nos Estados Unidos, cenário da história, mas em todo o mundo, inclusive o Brasil. E a autora escolhe começar o livro dessa maneira, com um soco no nosso estômago.

Qualquer um que lê o que ela descreve no primeiro capítulo deveria se revoltar. E muita gente se revolta pois já passou por situação semelhante. É esse o impacto que a autora quer causar. E ela consegue fazê-lo de maneira muito inteligente, no meu ponto de vista. Porque ao mesmo tempo que choca, a própria Emira, apesar de abalada, depois “supera” e tentar viver sua vida, com seus problemas adultos, apesar do ocorrido.

A narrativa em terceira pessoa é cativante. A autora consegue te prender logo de início. Não apenas pela trama, mas por sua escrita. A linguagem se aproxima do coloquial, o que ajuda muito o leitor a se identificar com a história. Sem falar que, apesar de o livro girar em torno do que acontecer a partir desse acontecimento com Emira, ele também retrata outras questões, como amizade, vida adulta, amor, entre outras coisas, que falarei depois.

RACISMO E PRIVILÉGIOS

Certamente, o ponto mais importante da história é, de fato, a discussão que a autora faz sobre racismo e privilégios. Mas ela vai além disso do preconceito e de como muitos brancos, ainda hoje, têm mais privilégios que negros, num mesmo ambiente – de trabalho e oportunidades, principalmente. Sem falar na questão de divisão de classes e também como boas intenções podem levar a sérias consequências.

Falo isso porque Emira quer esquecer o que aconteceu. Mas as pessoas que estão fora de seu círculo de amizade querem se “intrometer” nessa questão, insistindo de que ela deve ser ajudada, deve ter sua justiça. Obviamente, o que acontece com ela, e que reflete em muito nossa realidade, não deveria acontecer. Contudo, cabe à pessoa decidir isso. Alix, que é a pessoa privilegiada da história, inste em ajudar Emira. E é aí que o tiro sai pela culatra.

É nítido, quando olhamos da perspectiva de Alix, como ela só quer ajudar Emira por achar que é o certo para ela. E, claro, como isso afetará sua vida. Ela é culpada? Talvez. Mas tudo retorna a um termo que conhecemos bem: racismo estrutural. É aquela coisa que está enraizada na sociedade e que acabamos perpetuando no dia a dia, sem nem perceber. Ou, às vezes, conscientes de que é errado, mas isso não nos impede de prosseguir.

“NA CORDA BAMBA”, DE KILEY REID É UMA AULA

Dito tudo isso, só posso resumir que o livro é uma verdadeira aula, muito necessária, sobre racismo e tudo o que envolve esse tema. Cheguei a me emocionar, me colocando no lugar de Mira. Mas a maneira como a autora faz isso é de muita sutileza. Sem forçar a barra, sabe? Da mesma forma que o racismo está enraizado na sociedade, ela vai construindo sua história, deixando tudo o que precisa ser dito para as páginas.

Ah, eu gostei muito da citação do movimento Vidas Negras Importam (ou Black Lives Matter). Isso porque o livro se passa em 2015, mas mostra que o movimento já existia, apenas ganhando mais força nos últimos anos, por razões que, creio, quase todo mundo conhece. E, ainda neste sentido, tem um contexto político inserido na história, de maneira quase imperceptível, mas que, quem está antenado na política dos EUA, principalmente, consegue captar.

MUDANÇAS DE POSTURA

Voltando a falar da história em si, algo que gostaria de destacar é como Emira muda de postura quando está com Alix, com Briar e com as amigas. São três personalidades diferentes de uma mesma pessoa, mas que representam bem quem Emira é. Além disso, é interessante ver como o ocorrido no mercado parece mudar tudo para Alix, enquanto que para Emira a vida continua – apesar de deixá-la pensativa sobre sua vida e seu trabalho.

No entanto, essa mudança de postura também acontece com Alix, quando está em situações diferentes. E o contraste entre as duas é bem explorado pela autora, ainda que de uma forma delicada. Novamente, sem forçar a barra. Mas quem força um pouco a barra é Alix, em relação a Emira. Ela parece fascinada pela babá, principalmente após o que aconteceu no mercado. Ou melhor, obcecada mesmo.

AS TRAMAS PARALELAS DE “NA CORDA BAMBA”, DE KILEY REID

Bom, como eu disse, é um livro que trata de diversos temas e, nesse contexto, são tramas paralelas. Uma delas, é daquelas coincidências do universo, ou do destino. Ao passo que pode parecer óbvio, ou forçado, é curioso. Me peguei várias pensando que isso poderia ser uma possibilidade, logo no começo, mas nunca imaginei que de fato fosse se concretizar. E isso nos deixa ansiosos para saber quando o negócio vai explodir.

De certa forma, isso também ajuda mover a história. Outro ponto de destaque, pra mim, é a amizade de Emira com Zara, e das duas com Josefa e Shaunie. São cenas bem divertidas, mas também que nos passam uma mensagem bem legal sobre amizades e lealdade. E também como essas amizades podem influenciar nas nossas atitudes, ou como elas são importantes para superar certas coisas. Só digo que adoro essa amizade.

A CONCLUSÃO

Incrível é pouco pra descrever o final desse livro. Eu só queria chegar na Emira e dizer: arrasou! A autora deixou tudo para o final, para mostrar exatamente o que ela queria transmitir aos leitores. Chega a ser emocionante, pra mim. Por algo muito simples e que é tão necessário nos dias de hoje: esperança. De que a sociedade seja melhor e de que as pessoas entendam a importância de um movimento como “Vidas Negras Importam”.

Acho que o mais importante pra mim é a discussão que a autora traz. Mais do que isso, como ela desperta nos leitores a vontade de pesquisar mais sobre esses movimentos, sobre racismo estrutural, sobre privilégios. Enfim, ela traz o debate para nossas vidas, mesmo com tudo ao nosso redor já evidenciando como é importante discutir esse tema, de maneira urgente. Já fizemos muitos avanços, mas eu acho que podemos mais. Tenho certeza.

Bom, acho que é isso, então. Eu amei esse livro de uma maneira que não consigo resumir em palavras – pelo menos tentei nessa resenha haha. Pois bem, espero que tenham gostado e espero que deem uma chance para essa história. Você vai acabar percebendo que conhece muitas Emiras como a do livro. Com diferentes histórias e bagagens, mas todas com um ponto em comum: a luta por poder ser quem é, sem preconceitos. Só isso. Até a próxima!

Ficha técnica

Na corda bamba

Autora: Kiley Reid

Páginas: 320

Editora: Arqueiro

Ano: 2020

Onde comprar: Amazon (físico) | Amazon (eBook)

Por Douglas Oliveira

Jornalista, leitor voraz e apaixonado por música. Fantasia ou thriller são as escolhas preferidas, mas gosta de se aventurar em toda leitura que o faça sair da zona de conforto.

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