Um clássico e um tema polêmico: racismo. Mas não é só a isso que se resume a história de “O Sol é Para Todos”, de Harper Lee, lançado originalmente em 1960. A edição de 2015 (José Olympio), lida por este que vos fala, trouxe um projeto gráfico novo e uma nova tradução também. No entanto, nada disso muda o papel de conscientização sobre o racismo que esse livro se tornou nos anos 60 e exerce até hoje. Antes de continuar, lembre-se: é possível que contenha spoilers! 😉
Sinopse: Um livro emblemático sobre racismo e injustiça: a história de um advogado que defende um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca nos Estados Unidos dos anos 1930 e enfrenta represálias da comunidade racista. O livro é narrado pela sensível Scout, filha do advogado. Uma história atemporal sobre tolerância, perda da inocência e conceito de justiça.
O sol é para todos, com seu texto “forte, melodramático, sutil, cômico” (The New Yorker) se tornou um clássico para todas as idades e gerações.
A história é narrada pela pequena Scout, ou Jean Louise, que, em sua inocência de criança, conta os fatos que marcaram a cidade de Maycomb, no estado do Alabama, nos Estados Unidos, durante a década de 1930. Essa marca fica por um caso de Tom Robinson, um negro acusado (injustamente) de estuprar uma garota branca e quem o defende é ninguém menos que o pai de Scout e Jem (irmão de Jean Louise), Atticus Finch, um advogado renomado na cidade, que coloca tudo em risco ao defender um negro – o que, para as pessoas da cidade, naquela época, era um crime.
Só existe um tipo de gente: gente.
Voltando um pouco no tempo, num momento inicial, a história foca mais na infância de Scout e suas brincadeiras com o irmão Jem e o vizinho Dill, que aparece somente no verão, nas férias, e, se as previsões dele estiverem corretas, vai se casar com Scout. Tudo isso é narrado de forma natural e simples, mas somente preparando o terreno para o momento em que a vida deles mudará bastante.
Nesse começo, a trama fica por conta da curiosidade das três crianças a respeito do vizinho deles, a família Raddley, mais especificamente Boo Raddley, como eles o chamam, já que ele nunca sai de casa e a imaginação da cidade, principalmente das crianças, leva a diversas histórias e um mistério sobre a identidade de Boo, como ele é e quem realmente ele é. Mas, lembre-se dele! Boo Raddley tem seu significado na obra…
Voltando ao cerne da história, quando Atticus passa a defender Tom, a família Finch começa a ser vista de forma diferente pela população e Scout é quem narra esses momentos, já que, em sua escola, os reflexos dessa defesa também são presentes e de uma forma cruel, se pararmos para pensar, já que uma criança não tem muita percepção do quão cruel é o preconceito – é algo que é passado para ela pela família e pela sociedade que a rodeia.
Se só existe um tipo de gente, por que as pessoas não se entendem? Se são todos iguais, por que se esforçam para desprezar uns aos outros?
O que mais me marcou nesse livro foi como a autora conseguiu introduzir o assunto de racismo, unido a outros preconceitos e à injustiça, aos poucos numa história narrada por uma criança. O clímax do livro foi sendo introduzido aos poucos. E eu realmente acho que, a escola da autora de contar a história através da voz de uma criança, foi exatamente para mostrar esses pontos de uma forma humanizada.
Nós leitores sabemos que Tom não fez o que o acusam de ter feito, e nós só sabemos disso pois Atticus é uma pessoa justa e, mesmo sendo colocado para defender Tom, ele acredita em sua história, sabe que ele não o fez. E é por isso que nós sabemos algo que ninguém mais da cidade sabe (já que ele é negro): Tom é inocente. O desenrolar dessa história é impressionante. E é a forma como as pessoas veem Tom, e a forma como as pessoas vem Atticus, que mais me impressiona. É louco: parece que você quer estar lá e tentar colocar na cabeça dessas pessoas o quanto elas são ignorantes.
E o mais incrível: todas as tramas e todo o tema que envolve o mundo de O Sol é Para Todos de 1930 é o mesmo de hoje, século 21. Ainda temos preconceito, ainda temos injustiça e ainda temos pessoas ignorantes que não conseguem ver essas coisas.
Para finalizar, volto a destacar a inocência como é narrada essa história toda. É uma verdadeira montanha-russa. Um momento está tudo “bem”, as coisas são normais no mundo de Scout: brincadeiras, brigas com o irmão, os desafios do colégio. E aí vem essa enxurrada de situações que não dá para ver mais tanta inocência, e Scout tem que se adaptar a tudo isso.
E é isso! Eu demorei muito para ler esse clássico, mas, quando comecei, praticamente devorei o livro, e recomendo MUITO, porque, apesar de trazer temas presentes até hoje, nada custa ler algo que vai reforçar essa necessidade de as coisas mudarem, que preconceito é uma coisa do passado e, mais ainda, que nunca deveria ter existido.
PS: Só para lembrar, nossa outra colunista também já resenhou esse clássico. Confere lá: https://estacaoimaginaria.wordpress.com/2016/07/07/2566/
Ficha técnica
O Sol é Para Todos
Autora: Harper Lee
Editora: José Olympio
Ano: 2015
364 páginas