“Sentimos saudades daquilo que imaginamos ter vivido e não do que realmente vivemos” (pg. 10)
Saudade, solidão e sofrimento de um homem abatido pela vida parecem ser o cerne da obra de estreia (rapaz, e que estreia heim? começou com o pé direito já!) de André Nigri, Paralisia (2018), porém, não é bem assim.
Jofre Monteiro é filho de pais bons de grana e nunca precisou se preocupar economicamente com seu futuro, logo, não tem aquele dom de dar valor às coisas que possui e muito menos cria uma ambição de construir uma família, ou uma carreira, ficando paralisado onde está.
No fim de seu terceiro casamento, Jofre se afunda num abismo em si mesmo, se afogando em álcool, desespero e nas lembranças de seus fracassos. Diante desse vazio, Jofre contrata uma garota de programa, Kali (não preciso falar o motivo né, todo mundo sabe o que faz uma garota de programa). Dias depois, decide contatar Kali novamente, convidando-a para passar a ceia de Natal em sua casa, e eis que ela aparece em sua casa com a filha pequena, dando o ar de uma pseudo-família.
Na sequência, temos relatos de pessoas que passaram pela vida de Jofre, o que nos dá um background de sua vida e esclarece muitos tópicos de sua personalidade, que nos permite ter uma imagem clara de quem é Jofre Monteiro, porquê Jofre Monteiro é do jeito que é e como Jofre acabou assim.
A narrativa então retorna seus holofotes à Jofre, mas agora dez anos depois daquele Natal, onde já possui família e outras questões sociais e morais são tratadas.
Particularmente, me surpreendi com o livro. Possui uma leitura fácil e a alternância entre narração, e-mails, fragmentos de diários e afins são totalmente coerentes com a situação e importantes para a história, de modo que nada fica confuso nem perdido, ao contrário, ajuda na construção da trama e acaba no momento certo. Um livro curto, objetivo e atual. Recomendo a leitura para quem quiser tirar um pouco os pés dos mundos fantásticos e procura algo para refletir.
Além do mais, Nigri trata, de modo real e prático, uma realidade muito comum e que aos poucos deixa de chocar as pessoas — mas que deveria.